Emenda retira a agricultura das obrigações do Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa. Texto vai à Câmara
A Comissão de Meio Ambiente (CMA) do Senado aprovou por unanimidade nesta quarta-feira (4) o projeto de lei nº 412/2022, que regulamenta o mercado de carbono no Brasil. O texto apresentado pela senadora Leila Barros (PDT-DF), presidente da CMA e relatora da matéria, exclui o agronegócio de obrigações previstas no Sistema Brasileiro de Comércio de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE). O tema vai agora diretamente para discussão na Câmara dos Deputados, a menos que haja pedido para votação no plenário do Senado.
O SBCE prevê cotas de emissão anual de gases de efeito estufa distribuídas aos operadores. De acordo com a proposta, quem reduzir as próprias emissões pode adquirir créditos e vendê-los a quem não cumprir suas cotas. O objetivo é incentivar a redução das emissões, atendendo a determinações da Política Nacional sobre Mudança do Clima, de 2009, e de acordos internacionais firmados pelo Brasil.
De acordo com o projeto de lei aprovado na quarta, ficam sujeitas às regras do SBCE para o mercado de carbono empresas e pessoas físicas que emitirem acima de 10 mil toneladas de gás carbônico equivalente (tCO2e) por ano. Esses operadores devem monitorar e informar suas emissões e remoções anuais de gases de efeito estufa. Quem emitir mais de 25 mil tCO2e também deve comprovar o cumprimento de obrigações relacionadas à emissão de gases.
A votação ocorreu após a costura de um acordo com a Frente Parlamentar da Agropecuária. A versão aprovada não considera a produção primária agropecuária como atividades, fontes ou instalações reguladas e submetidas ao SBCE. Outro dispositivo aprovado retira do sistema as emissões indiretas decorrentes da produção de insumos ou de matérias-primas agropecuárias.
“O mérito das emendas reflete o que se observa nos principais mercados regulados de carbono em que a agropecuária não é incluída na regulação, sobretudo pela importância do setor para a segurança alimentar e pelas muitas incertezas ainda existentes na metodologia de estimativa de emissões”, disse a relatora Leila Barros. “Entendemos que mais importante do que regular atividades agropecuárias é incentivar a difusão de técnicas de agricultura de baixo carbono que, ao mesmo tempo, aumentem a renda do produtor rural, tornem os sistemas rurais mais resilientes aos efeitos adversos da mudança do clima e proporcionem redução e sequestro de emissões.”
O Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), entidade que desde 2016 acompanha a discussão do marco regulatório para o tema, considera que a aprovação do projeto no Senado é “um importante avanço para que o Brasil permaneça competitivo nos mercados globais e alcance os compromissos firmados no Acordo de Paris”. Segundo a instituição, “é fundamental implementar esse sistema, estabelecendo os princípios fundamentais de funcionamento, como já foi feito em outras regiões do mundo”.
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Plano Nacional de Alocação
Segundo o projeto de lei, o órgão gestor do SBCE deve elaborar o Plano Nacional de Alocação (PNA), que vai definir a quantidade de emissões a que cada operador tem direito. Essa quantidade é representada pelas Cotas Brasileiras de Emissões (CBE). Cada CBE (equivalente a 1 tCO2e) é considerada um ativo comercializável, que pode ser recebida gratuitamente pelos operadores ou comprada para “conciliar” as metas de emissão.
Além das CBE, o projeto cria o Certificado de Redução ou Remoção Verificada de Emissões (CRVE). Outro ativo comercializável, o CRVE representa o crédito de carbono gerado pela efetiva redução de emissões ou remoção de 1 tCO2e de gases de efeito estufa. O certificado também pode ser comprado pelas empresas e usado no cálculo para comprovar o cumprimento de suas metas. Além disso, o CRVE pode ser usado, após autorização, em transferências internacionais no âmbito do Acordo de Paris.
Todos os operadores devem apresentar periodicamente um plano de monitoramento e um relato das emissões e remoções de gases de efeito estufa. Já aqueles com emissões superiores a 25 mil tCO2e devem comprovar que detêm CBEs e CRVEs equivalentes a suas emissões.
Esses ativos podem ser transacionados em bolsa de valores conforme regulamentação a ser feita pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Sobre o lucro resultante da venda incide imposto de renda, calculado sobre o ganho líquido quando a transação ocorrer na bolsa, ou sobre o ganho de capital, nas demais situações.
Sobre as transações, não incidem tributos como PIS/Pasep ou Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins). O uso de CBEs e CRVEs para compensar emissões permite a dedução dos gastos relacionados na apuração do lucro real e da base de cálculo da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
Segundo o PL 412/2022, o PNA deve ser aprovado pelo menos 12 meses antes de entrar em vigor e pode estabelecer tratamento diferenciado para determinados setores em razão das características das atividades, do faturamento, da localização e dos níveis de emissão. Todos os ativos devem estar inscritos no Registro Central do SBCE, onde deve ser feita a contabilidade de CBEs e CRVEs concedidos, adquiridos, detidos, transferidos e cancelados (usados na conciliação de metas).
Punições previstas no projeto
O descumprimento das regras do SBCE pode acarretar punições como multa de até R$ 5 milhões ou 5% do faturamento bruto da empresa. Um ato do órgão gestor do SBCE vai definir as infrações puníveis. Outras sanções previstas são: embargo da atividade; perda de benefícios fiscais e linhas de financiamento; proibição de contratação com a administração pública por três anos; e cancelamento de registro.
Pelo substitutivo aprovado pela CMA, o SBCE terá um órgão gestor encarregado de regular o mercado e rever limites anuais de emissão de gases de efeito estufa acima do qual os operadores serão obrigados a monitorar suas emissões. Outras atribuições do órgão gestor são: elaborar e implementar o PNA; emitir e leiloar CBE; apurar infrações; e aplicar punições pelo descumprimento das regras do sistema.
Regra de transição do mercado de carbono
O projeto de lei estabelece um prazo transitório para a entrada em vigor das regras relacionadas ao mercado de carbono. De acordo com o texto, o órgão gestor terá até dois anos para regulamentar o sistema. Depois de feita a regulamentação, os operadores terão mais dois anos antes de serem obrigados a conciliar suas metas — dentro desse prazo, devem apenas apresentar planos e relatos de emissões.
De acordo com a relatora, Leila Barros, o mercado de carbono movimentou cerca de US$ 100 bilhões em 2022, com sistemas em funcionamento em diversos países. “O Brasil tem papel crucial para suprir a demanda de ativos ambientais no contexto de um mercado global de carbono, considerando nosso imenso patrimônio florestal e nossa matriz energética. Um robusto marco regulatório é a base para a transição econômica e climática pretendida”, escreveu a parlamentar no relatório.
Com informações da Agência Senado.
Foto: Geraldo Magela/Agência Senado.
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