Entre os desafios enfrentados por membros da comunidade LGBTQIAPN+ no mercado de trabalho, sentimento de insuficiência e busca por validação ganham destaque
POR BÁRBARA VETOS
A síndrome do impostor é um fenômeno que faz com que as pessoas duvidem de si mesmas e não se achem aptas ou boas o suficiente para exercerem determinada função. Elas sentem como se não fossem merecedoras e estivessem o tempo todo enganando as pessoas ao redor.
Apesar de ser conhecida como síndrome, não é propriamente uma doença, mas um conjunto de sentimentos comumente manifestados no meio acadêmico ou corporativo. De acordo com uma pesquisa da Universidade Dominicana da Califórnia, 70% dos profissionais admitem já terem se sentido assim pelo menos uma vez na vida.
Realidade que pode ser ainda mais crítica para membros de grupos minorizados, como a comunidade LGBTQIAPN+. “Sinto que já nascemos com a síndrome do impostor, porque temos que conquistar a aceitação desde pequenos e em todos os espaços”, diz Gabriel Gatto, consultor e analista em RH na TOTVS.
Para boa parte dessa população, o mercado de trabalho pode também significar o enfrentamento de uma série de desafios, como situações de preconceito e microagressões diárias. Uma pesquisa de 2022 da plataforma de recrutamento e seleção de empregos da Catho mostrou que 52% dos entrevistados sofrem discriminação no trabalho com frequência e 45% não falam abertamente sobre sua orientação sexual. Já os cargos de liderança só são ocupados por 8% dessa população, segundo levantamento da consultoria Great Place To Work (GPTW).
“Quando eu assumi o cargo de liderança em que eu estou hoje, eu achava que eu não daria conta. Tentava me provar o tempo todo, pensado o que eu deveria fazer para ser aceito pelos outros”, relata Gatto. O trauma vem de experiências anteriores, em que seu antigo gestor falava para ele tomar cuidado para não “desmunhecar” ou falar com a voz mais fina durante reuniões com grandes executivos. “É uma coisa que fica no subconsciente e vai sendo alimentada ao longo da vida.”
Lideranças e o favorecimento de pessoas do mesmo grupo
Um estudo realizado pela Fuqua School of Business da Duke University, nos Estados Unidos, mostrou que a adoção de práticas de diversidade e inclusão nas empresas pode ter um impacto distinto dependendo de quem está por trás disso. Os resultados mostram que as opiniões dos funcionários foram piores quando os líderes negros e asiáticos se envolveram em ações em prol de suas respectivas etnias – eles os acusavam de favoritismo a pessoas do mesmo grupo. Os que estiveram ligados a causas inter-raciais foram melhor ranqueados pelos 301 entrevistados e vistos como lideranças eficazes.
Apesar de o levantamento americano focar em questões raciais, Gatto comenta que o mesmo acontece com membros da comunidade LGBTQIAPN+. “Já ouvi comentários de que estava contratando outro homem gay para favorecer, porque queria namorar a pessoa.” Para ele, não faz sentido uma liderança ser elogiada por adotar uma prática e outra ser criticada por ter a mesma atitude.
Isso também impacta os sentimentos de culpa e inadequação naquele espaço por parte do profissional LGBTQIAPN+. “Se eu faço parte de um comitê de diversidade, eu também tenho que propagar a diversidade”, explica, “então é claro que vou contratar pessoas de todos os grupos, inclusive LGBT”.
Gatto defende que um ambiente de trabalho acolhedor é aquele em que as pessoas podem ser quem elas realmente são. “É preciso que haja uma mudança de cultura na empresa e que a diversidade seja o pilar disso.”
Pauta de diversidade e inclusão nas empresas
O consultor afirma que os grupos de afinidade podem ser um caminho para a superação dos sentimentos causados pela síndrome do impostor e para o maior envolvimento das empresas na pauta de diversidade e inclusão. Esses coletivos podem ser formados com diferentes motivações, como gênero, etnia, orientação sexual ou identidade de gênero. O objetivo é que os funcionários se sintam confortáveis para expor suas dores e questões dentro e fora da empresa.
“É sobre pertencimento, sobre vermos que não estamos sozinhos”, comenta. Além dos encontros de cada grupo, também existe um momento em que todos se unem para trabalhar sob o viés da interseccionalidade. “Podemos ter mulher preta e lésbica na equipe, por exemplo. Ela faz parte de três grupos e eles precisam dialogar entre si.”
A partir da troca de conhecimento e experiências, Gatto percebe que os membros da comunidade passam a se sentir mais autoconfiantes e confortáveis naquele espaço, duvidando menos de suas habilidades. “A diversidade é isso, faz com que a gente consiga trabalhar em um ambiente repleto de pessoas iguais e diferentes da gente.”
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