Tecido sintético é a maior fonte de microfibras; saiba como lavar as roupas de forma mais sustentável
POR JUDITH WEIS
Os microplásticos estão aparecendo em todos os lugares, desde topos de montanhas remotas até fossas oceânicas profundas. Eles também estão em muitos animais, incluindo os humanos.
Os microplásticos mais comuns no meio ambiente são as microfibras – fragmentos de plástico em forma de pequenos fios ou filamentos. Elas vêm de muitas fontes, incluindo pontas de cigarro, redes de pesca e cordas. Mas a maior fonte são os tecidos sintéticos, que as desprendem constantemente.
Os tecidos liberam microfibras enquanto são fabricados, usados e eliminados, mas principalmente quando são lavados. Uma única carga de lavagem pode liberar dezenas de milhões de microfibras. Muitos fatores afetam a quantidade de fibras liberadas, incluindo tipo de tecido, ação mecânica, detergentes, temperatura e duração do ciclo de lavagem.
A minha investigação se concentra na ecologia costeira e na poluição da água, incluindo trabalhos em pântanos e estuários de Nova York e Nova Jersey que são fortemente afetados pelas atividades humanas. Aqui estão algumas coisas que você deve saber sobre como reduzir a poluição de microplásticos da sua máquina de lavar.
Microfibras: do tecido à água e ao solo
Depois que as roupas liberam microfibras nas máquinas de lavar, as fibras entram no fluxo de águas residuais, que geralmente vai para uma estação de tratamento de águas residuais. Estações de tratamento avançadas podem remover até 99% das microfibras da água. Mas como uma única carga de roupa pode produzir milhões de fibras, a água tratada descarregada da estação de tratamento ainda contém um grande número delas.
As microfibras removidas durante o tratamento acabam em lodo de esgoto – uma mistura de materiais sólidos que é processada para remover patógenos. Em muitos casos, o lodo de esgoto tratado é aplicado ao solo como fertilizante. Isso permite que as microfibras entrem no ar e no solo, sejam transferidas para os organismos do solo e para a cadeia alimentar terrestre ou absorvidas pelas plantações.
Os microplásticos que chegam aos rios, lagos e baías podem ter vários efeitos nocivos. Eles podem ser consumidos por peixes e outros animais aquáticos, afetando a sua bioquímica, fisiologia, reprodução, desenvolvimento ou comportamento. Esses microplásticos contêm aditivos químicos, incluindo substâncias como ftalatos e bisfenol A, que podem ser absorvidos e ter efeitos na saúde de seres humanos e animais, incluindo efeitos no sistema endócrino.
As microfibras têxteis também contêm produtos químicos adicionais que já se mostraram tóxicos, como corantes para tecidos, agentes antirrugas e retardantes de chama. Além disso, os contaminantes presentes na água, como metais e pesticidas, podem aderir às partículas dos microplásticos, transformando-as em um verdadeiro coquetel de contaminantes que podem ser transferidos para os animais que os ingerem.
Lave de forma mais sustentável
Nem todos os tecidos liberam microfibras na mesma proporção. Um tecido frouxo que parece fofo ou felpudo, como o fleece, solta mais do que um mais entrelaçado. Embora as roupas feitas de fibras naturais, como algodão e lã, pareçam ser uma solução, infelizmente elas também liberam microfibras que podem acumular poluentes no meio ambiente.
Alguns cientistas e fabricantes têxteis estão desenvolvendo tecidos que se desprendem menos do que os que já existem, graças a características como fibras mais longas e revestimentos para evitar a descamação. Enquanto isso, aqui estão algumas maneiras de reduzir que a microfibra se solte da sua roupa:
- Lave a roupa com menos frequência. Lavar cargas completas em vez de cargas parciais reduz a liberação de microfibras pois as roupas ficam expostas a menos fricção durante o ciclo de lavagem.
- Use água fria, que libera menos microfibras do que água quente.
- Use menos detergente, o que aumenta a liberação de microfibra.
- Use uma máquina de lavar com carregamento frontal, cuja ação de rotação produz menos liberação de microfibra.
- Seque a roupa em um varal. Colocar roupas em secadoras libera microfibras adicionais no ar pela ventilação da máquina.
Vários tipos de produtos coletam microfibras na lavadora antes de serem liberadas nas águas residuais. Alguns são sacos para roupa suja feitos de monofilamento tecido, um filamento único de poliamida que não se desintegra em fibras. A roupa é lavada dentro do saco, que retém as microfibras que são liberadas. Um estudo de um desses produtos, o Guppyfriend, descobriu que o saco coletava cerca de um terço das microfibras liberadas.
Outro dispositivo, o Cora Ball, é uma bola de plástico com espinhos cobertos por discos de plástico macio que capturam microfibras. Ela reduz as microfibras em cerca de 25% a 30%, mas pode não ser adequada para malhas soltas porque há chance de prender nos fios e danificar as roupas.
Filtre a sua água de lavagem
Estão disponíveis várias marcas de filtros externos que podem ser adaptados em máquinas de lavar. Os filtros chegam a remover até 90% das microfibras da água de enxágue. Seu custo médio é cerca de US$ 150 nos Estados Unidos (aproximadamente R$ 743, segundo cotação atual). Os donos precisam limpar os filtros periodicamente e descartar as microfibras coletadas com outros resíduos sólidos, e não no ralo, o que as colocaria de volta no fluxo de águas residuais.
Em um estudo de 2021, os pesquisadores instalaram filtros para máquinas de lavar em 97 casas numa cidade em Ontário, no Canadá, o que representava cerca de 10% dos domicílios da comunidade. Eles descobriram que isso reduziu significativamente as microfibras na água tratada da estação de tratamento local.
Agora, algumas empresas fabricam máquinas de lavar com filtros de microfibra integrados. A França promulgou um requisito para que todas as novas máquinas sejam equipadas com filtros até 2025, e a Austrália anunciou que os filtros serão exigidos em lavadoras comerciais e residenciais até 2030.
Nos Estados Unidos, uma exigência semelhante foi aprovada pelo Legislativo da Califórnia em 2023, mas o governador Gavin Newsom vetou o projeto, dizendo estar preocupado com o custo para os consumidores. Um estudo econômico encomendado pela Ocean Conservancy descobriu que os filtros aumentariam o preço das máquinas de lavar em apenas US$ 14 a US$ 20 por máquina. Vários estados estão considerando regulamentações que exigiriam filtros nas lavadoras.
Na minha opinião, exigir que os fabricantes adicionem filtros que possam reter microfibras nas máquinas de lavar é uma medida razoável e acessível que poderia reduzir rapidamente as enormes quantidades de microfibras nas águas residuais. A solução final será a reengenharia de tecidos, que não se desfarão, mas que levará algum tempo para desenvolver e transportar para as cadeias de abastecimento de vestuário. Enquanto isso, os filtros são a maneira mais eficaz de resolver o problema.
Judith Weis – Professora emérita de Ciências Biológicas da Universidade Rutgers em Newark, Estados Unidos.
Este texto foi republicado de The Conversation sob uma licença Creative Commons. Leia o artigo original em inglês.
Leia mais artigos do ESG Insights.
- Newsletter ESG Insights – Grátis: receba um resumo semanal de notícias no seu e-mail.
ÚLTIMAS NOTÍCIAS
- Desmatamento e perda de biodiversidade são ameaça à segurança alimentarPerda da cobertura florestal provoca um desequilíbrio em toda a cadeia alimentar dos ecossistemas
- Novas regras podem dificultar entrada de produtos agrícolas brasileiros na EuropaLegislação que reforça fiscalização sobre produtos gerados sem respeito ao meio pode dificultar interesses comerciais do Brasil
- Democratizando a felicidade no trabalho: revendo a escala 6×1Esquema de trabalho 4×3 ainda é um privilégio de uma elite corporativa, enquanto maioria enfrenta longas jornadas
- Projeto de mercado de crédito de carbono volta à CâmaraCom a aprovação no Senado com mudanças, texto retorna para nova análise dos deputados
- Novo plano de restauração pode deslanchar o Código FlorestalAté 2030, o Brasil pretende restaurar 12 milhões de hectares com a implementação do Código Florestal pelo Planaveg
- Capital do ouro ilegal resiste a operações contra o garimpo na AmazôniaAs operações contra o ouro ilegal levaram à revolta dos garimpeiros, que tentam retomar a atividade
- Flexibilização da legislação impulsiona o desmatamento do Cerrado na BahiaDiferentemente da Amazônia, onde a ilegalidade é regra, no Cerrado baiano é o desmatamento autorizado que mais preocupa
- Crise climática, social e da biodiversidade estão interligadasRevisar o Código Florestal, fortalecer práticas agroflorestais e fazer a transição para um agronegócio de baixo carbono são algumas das ações fundamentais para o Brasil reduzir suas emissões
- Natura recebe certificação como Empresa B pela quarta vez consecutivaO principal destaque da pontuação foi o avanço na geração de renda e nas iniciativas voltadas para o bem-estar das consultoras de beleza da marca
- Como as hidrelétricas estão acabando com os peixes no Rio MadeiraSegundo cientistas, as centrais hidrelétricas da Bacia do Madeira afetam o ciclo hidrológico e impactam os padrões migratórios dos peixes