Como construir uma cultura ESG e ser sustentável. Dicas para empresas que estão iniciando
POR PIETRA BASTOS
Ter uma agenda ESG (sigla em inglês para Ambiental, Social e Governança) não é somente o diferencial de uma empresa, e sim um pré-requisito para crescer de forma sustentável e duradoura. Não importa o nível de maturidade do negócio ou setor de atuação. Quem não adota os critérios é deixado de lado no mercado. Saiba mais o que é ESG.
De acordo com o levantamento Panorama ESG Brasil 2023, realizado pela Câmara de Comércio Americana (Amcham) em parceria com a Humanizadas, 47% das empresas já estão implementando práticas ESG e 31% planejam aderir à agenda.
Mas, ao iniciar essa jornada, algumas organizações podem encontrar barreiras que atrapalham as práticas do ESG. Ausência de uma cultura forte de sustentabilidade (32%), dificuldade em mensurar e monitorar indicadores (38%) e conscientizar e capacitar equipes e lideranças sobre as práticas (48%) são alguns obstáculos mencionados pelo levantamento.
O ESG Insights preparou um guia com orientações para empresas que planejam incorporar pela primeira vez os pilares ESG no DNA da sua companhia.
Os primeiros passos da jornada ESG
O primeiro passo que uma empresa deve seguir para iniciar uma estratégia ESG é fazer uma avaliação interna. Segundo Carolina Pimentel, fundadora e CEO da consultoria Geração Social, é fundamental entender em que pé ela está nos pilares de sustentabilidade, social e governança.
Uma forma de medir esse impacto é por meio de ferramentas de diagnóstico disponíveis no mercado, como a Sistema B, EcoVadis e Geração Social. Pimentel também sugere ter como referência a norma técnica ABNT PR 2030 e os Indicadores Ethos.
Depois de analisar seu contexto interno, a organização deve partir para um olhar setorial. O SASB (Conselho de Padrões Contábeis de Sustentabilidade) é um exemplo de plataforma que mostra quais indicadores dos três critérios a empresa de determinado setor deve prestar atenção. Se ela faz parte de alguma associação vale a pena conferir se há estudos que indicam quais práticas ela deve aderir.
Durante esse processo é fundamental escutar as partes interessadas, como colaboradores, fornecedores e clientes. Isso é conhecido como materialidade, que é o cruzamento dos temas de interesse dos stakeholders com os temas de impacto para o negócio.
Comprometimento com uma agenda ESG global
A empresa também deve ficar de olho nos objetivos e metas globais e traduzir para o seu contexto empresarial. Entender como ela pode se comprometer com os 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e se juntar ao Pacto Global, movimentos da Organização das Nações Unidas (ONU), e usá-los como referências para traçar estratégias.
O Pacto Global aborda temas específicos no ambiente de trabalho, como equidade racial, transparência, economia circular e saúde mental. A iniciativa oferece cursos de capacitação e treinamentos.
“É importante porque quando a empresa traçar uma estratégia, ela já vai ter uma diretriz de como está dentro dela, do que é importante para o setor e para um contexto global. Ela pode construir ações pautadas num contexto maior que vão trazer retorno para a sociedade e para o negócio”, diz Carolina Pimentel.
Como construir uma cultura ESG na empresa
Funcionários, clientes e fornecedores precisam estar engajados para que seja possível construir uma cultura ESG na empresa. Uma forma de fazer isso é transformar todos os posicionamentos em uma política acessível às pessoas no dia a dia. Outra ação é criar comitês internos diversificados. Isto é, formados por pessoas de diferentes áreas da empresa, e não apenas de um setor.
Outro ponto que ajuda a construir uma cultura ESG é usar uma linguagem simples e que aproxima as pessoas, recomenda Pimentel. Substituir termos como “gestão de resíduos” ou “economia circular” por reciclagem, por exemplo.
“Eu acho que isso é muito importante. As pessoas que executarem um projeto ESG na empresa têm que aprender a conversar sobre ESG. O CEO vai querer um termo mais rebuscado, números. Mas o colaborador, a pessoa que vai executar [sua função] no dia a dia, quer algo que seja simples, fácil de entender. E principalmente que ela entenda qual é o seu papel naquilo, qual é o impacto que consegue causar e qual a diferença que está fazendo na vida das pessoas”, explica.
Diversidade e inclusão significa inovação
Um time diverso e inclusivo traz inovação para a empresa: diferentes perspectivas e ideias para ações, negócios diversificados e acesso a um novo mercado consumidor.
Para isso, a organização precisa analisar o perfil da equipe e questionar quantas mulheres, pessoas negras e LGBTQIAPN+ trabalham no grupo; se há pessoas com mais de 50 anos ou com deficiência; se são dadas oportunidades para jovens aprendizes e outros profissionais em início de carreira; qual é a condição social e o nível de educação de cada um. O levantamento vai gerar outras questões como quais espaços essas pessoas ocupam e quem ocupa os cargos de liderança.
O cruzamento de dados pode resultar no anúncio de vagas afirmativas ou em oportunidades e promoção de funcionários, por exemplo. Segundo Carolina Pimentel, é preciso traçar uma cultura interna sem vieses inconscientes que impeçam que pessoas de grupos minorizados alcancem cargos altos. “Até pensar em algumas medidas compensatórias. Se a pessoa, por exemplo, não teve acesso ao Ensino Médio, ela vai estar em desvantagem para alcançar um cargo de liderança. Então que tipos de ações a gente consegue fazer para ajudar essa pessoa nos conhecimentos?”, questiona.
Relatório social é um diferencial para a empresa
Montar um relatório social é um dos principais desafios, especialmente quando é o primeiro de todos. Mas é um diferencial para quem está começando a jornada ESG.
De acordo com Pimentel, o relatório é uma grande tendência que veio para ficar. Isso porque os bancos e as seguradoras estão precificando o risco ESG e solicitando aos clientes o documento.
Também é um requisito da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que está exigindo até 2026 que todas as empresas de capital aberto façam um relatório seguindo as normas do International Sustainability Standards Board (ISSB).
A CEO da Geração Social observa que é comum que empresas novas em ESG sintam receio em mostrar resultados que ainda estão longe de serem sustentáveis, e isso pode adiar o comprometimento com a agenda. Uma solução é lançar primeiro um relatório interno para se acostumar.
Dicas para comunicar metas e resultados em um relatório ESG
Carolina Pimentel recomenda se amparar em metodologias existentes do mercado pois é um jeito de sentir segurança e correr menos riscos, como greenwashing.
A ABNT PR 2030 traz pontos do que pode ser trabalhado em cada um dos critérios ESG e explica termos do meio. Os indicadores do SASB também são interessantes pois são específicos para o setor de atuação da empresa.
Os ODS e o Pacto Global têm diretrizes que podem se conectar com as ações da empresa. Uma ação de diversidade pode se relacionar a ODS 10, Redução das Desigualdades, ou reciclagem a ODS 12, Consumo e Produção Responsáveis.
As normas da organização Global Reporting Initiative (GRI) também podem servir de apoio para empresas que estão iniciando e são usadas por grande parte das grandes companhias no Brasil e no mundo. A GRI oferece conjunto de indicadores e orientações de como montar um relatório. Dentre elas, ouvir as partes interessadas, listar os riscos e os princípios e construir uma matriz de materialidade.
“É legal porque a empresa vai fazer um relatório que ela já vai mostrar o que ela tem. Se relacionar com uma agenda maior que a dela e ir para um contexto maior que vai ajudar a definir depois compromissos públicos e metas”, diz Pimentel.
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Todo tipo de empresa pode ter práticas sustentáveis
Um erro fácil de cometer é pensar que apenas negócios relacionados ao meio ambiente devem ser sustentáveis, como no caso dos setores alimentício e têxtil. Mas a verdade é que isso vale para todo tipo de organização.
Uma empresa de tecnologia, por exemplo, tem um alto gasto de energia por causa do intenso uso de dados em data centers. E o consumo de energia é algo que contribui para a crise climática.
Pimentel aconselha a fazer um diagnóstico para examinar quais são os impactos da empresa no meio ambiente e se é significativo ou não para o setor. Economizar energia, usar fonte renovável, evitar o desperdício de água e controlar a geração de resíduos são ações simples, mas que merecem atenção e podem ser pontos de partida para uma empresa ser sustentável.
Uma vez que esse comportamento esteja desenvolvido, é interessante ela incorporar isso na sua comunicação também. Ou seja, inspirar clientes e fornecedores a respeito da importância dos cuidados com o meio ambiente. “É um ponto importante as empresas perceberem que o impacto não para nelas, mas que vai para toda a cadeia. Desde o fornecimento para clientes e outras partes que estejam em volta, inclusive comunidades”, avalia.
Outras práticas ESG que não podem faltar
Confira outras práticas dos três eixos, ambiental, social e governança, essenciais para adotar na empresa, de acordo com Pimentel:
Ambiental
- Reduzir, reciclar e reutilizar.
- Fazer um Inventário de emissões de gases de efeito estufa (GEE) e medir a pegada de carbono.
Social
- Fazer uma pesquisa de clima organizacional no dia a dia e ouvir funcionários.
- Criar ações para impactar a comunidade ao redor, desenvolvendo novos talentos e conquistando potenciais consumidores.
Governança
- Elaborar um código de ética para reforçar valores da empresa, orientar ações e definir boas e más condutas, como corrupção.
- Criar um canal de ouvidoria para colaboradores, clientes e fornecedores.
- Seguir a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD).
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