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Democratizando a felicidade no trabalho: revendo a escala 6×1

Jornada de trabalho volta à discussão no Congresso com nova proposta de mudança constitucional (Foto: Jannonivergall/Pixabay)

Esquema de trabalho 4×3 ainda é um privilégio de uma elite corporativa, enquanto maioria enfrenta longas jornadas

POR RODRIGO DE AQUINO

As desigualdades no mercado de trabalho no Brasil são evidentes, refletindo uma clara divisão entre os entre a “periferia” e a “área nobre” da vida profissional. Enquanto algumas empresas discutem como promover o bem-estar no ambiente corporativo, muitos trabalhadores brasileiros ainda enfrentam jornadas longas e cansativas, com pouco tempo para descanso ou para cuidar de si. Esse privilégio, restrito a uma pequena elite corporativa que consegue adotar jornadas como o modelo 4×3, está distante da realidade da maioria da força de trabalho.

Estudos da Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas (FGV-EAESP) indicam que modelos de jornada reduzida, já em teste no Brasil e em outros países, têm mostrado resultados promissores. Esses modelos envolvem a redução da carga horária para 80% do tempo regular, mantendo 100% do salário e da produtividade. Além de melhorar a qualidade de vida dos profissionais, esses formatos provam que menos horas de trabalho não comprometem a produtividade, ao mesmo tempo em que contribuem para ganhos significativos em saúde física, energia, redução do estresse e qualidade no desempenho das tarefas.

A utopia de uma vida feita para viver e não apenas para trabalhar precisa ser cultivada.

A cultura corporativa precisa ser reconfigurada para valorizar o ser humano em sua totalidade, e não apenas como uma mão de obra. Ambientes de trabalho que priorizam relacionamentos saudáveis, descanso adequado e oportunidades de desenvolvimento pessoal são fundamentais para o desempenho e a saúde mental dos colaboradores.

Para que a jornada de quatro dias se torne uma realidade para mais pessoas, é necessário repensar a gestão do tempo de trabalho, criar políticas públicas que incentivem a adoção desses modelos e, principalmente, promover um esforço coletivo para transformar a realidade de muitos.

Sejamos realistas: se houvesse uma gestão que respeitasse, de fato, o modelo 5×2, o cenário da saúde mental dos trabalhadores seria bem diferente. Em vez de jornadas sobrecarregadas e pressões constantes, teríamos ambientes mais saudáveis, com menos estresse e mais tempo para que as pessoas cuidem de si mesmas. Relatórios do Fórum Econômico Mundial apontam que funcionários felizes são até 13% mais produtivos, trazendo benefícios diretos para as empresas. A valorização do bem-estar reflete-se em maior engajamento, retenção de talentos e uma cultura organizacional mais forte e inovadora.

Jornada 6×1 e saúde mental

O Brasil, último país a abolir o regime de escravidão, ainda carrega vestígios dessa herança abusiva nas rotinas de trabalho atuais. Parafraseando Bertrand Russell, vencedor do Nobel de Literatura em 1950: “A moralidade do sistema 6×1 é a moralidade dos escravos; o mundo moderno não precisa de escravidão, mas sim de um modelo social em que as pessoas possam florescer”.

Quando a dignidade e a saúde mental dos trabalhadores são respeitadas, os resultados para as organizações são marcadamente positivos, com maior comprometimento e desempenho dos funcionários.

Insistir na escala 6×1 contraria a Norma Regulamentadora nº 1 do (atual) Ministério do Trabalho e Emprego, que estabelece diretrizes para promover o bem-estar psicológico e a segurança dos trabalhadores, impede que o trabalhador atinja seu pleno potencial, tanto pessoal quanto profissional, aumentando os riscos de burnout, ansiedade e depressão, o que pode levar ao aumento do absenteísmo, licenças de trabalho e eventuais processos.

O mundo mudou. A realidade laboral mudou. Ambientes antiquados e jornadas sobrecarregadas não apenas sufocam a criatividade e a inovação, mas também dificultam a retenção de talentos e a construção de uma imagem competitiva no mercado – com fornecedores, parceiros, clientes etc. O cenário atual exige, urgentemente, uma revisão da cultura das organizações, promovendo uma abordagem mais virtuosa, que privilegie o bem-estar físico, mental e emocional de todos, para que todos vivam dignamente.

A felicidade no trabalho é um fator estratégico que deve servir como um farol para promover a sustentabilidade das empresas, a longevidade das marcas e, principalmente, o bem-estar dos indivíduos. Ela nunca deve ser usada para anestesiar, iludir ou alienar. Quando as pessoas se sentem verdadeiramente respeitadas por seus empregadores, seu potencial floresce, beneficiando toda a sociedade. Criar um ambiente mais justo e equilibrado para quem trabalha terá reflexos no florescimento coletivo e na construção de uma prosperidade real e duradoura para todos.

Rodrigo de Aquino – Comunicólogo e executivo na área do bem-estar. É embaixador em São Paulo da ONG Doe Sentimentos Positivos e fundador do Instituto DignaMente.

Foto: Jannonivergall/Pixabay
Jornada de trabalho volta à discussão no Congresso com nova proposta de mudança constitucional

 

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