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Etarismo nas empresas dificulta contratação e troca de experiências intergeracionais

Etarismo impõe barreiras e não promove diversidade (Foto: Freepik)

Preconceito atinge a população cada vez mais cedo e causa impactos na saúde mental

POR BÁRBARA VETOS

Em um dia você trabalha ao lado de uma pessoa experiente, que te ensina, desenvolve projetos e entrega resultados. No outro, ela aparece com uma caixa de papelão, recolhe seus pertences e não volta mais. O que mudou, assim, tão de repente? Ela completou 60 anos.

A situação ocorreu com um colega de Juliana Ramalho, CEO da Talento Sênior, empresa atuante na contratação de profissionais com mais de 45 anos, que foi submetido à aposentadoria compulsória enquanto ela ainda estava no começo da carreira.

O relato chama atenção para uma realidade que muitas vezes surge antes dos 60. Aos 40, trabalhadores já apontam dificuldades para se manterem empregados no Brasil. Em um momento em que as companhias cada vez mais discutem suas práticas ESG focadas no tripé social – que inclui a não discriminação e a geração de oportunidade a todos – não deixa de ser contraditório.

Por mais que seja um processo natural da vida, o envelhecimento pode se tornar sinônimo de desemprego e exclusão no mercado de trabalho. Questão que aponta para um problema ainda maior quando analisado pela ótica da pirâmide etária brasileira, que cresce entre adultos e idosos.

De acordo com o IBGE, o número de idosos no país aumentou 57,4% entre 2010 e 2022 e mais da metade da população já passou dos 35 anos. Por isso, a CEO reforça que as empresas deveriam promover ações que refletissem a pirâmide etária brasileira.

Etarismo e mudança de carreira

Em 2016, quando já estava encerrando sua carreira em um banco depois de 35 anos atuando na área financeira, Maria do Carmo Silveira, atualmente com 61 anos, ouviu de seu superior o anúncio de que a empresa passaria a discutir a demissão dos funcionários mais velhos, após mudança na diretoria. Seu contra-argumento foi de que seria um desperdício de conhecimento e expertise. Mas a resposta foi de que essas pessoas podem ser facilmente substituídas.

“Aquilo foi um processo bem pesado para mim. Pensei, ‘eu estou no mesmo nível de todo mundo, vai chegar a minha vez.’” A reformulação da equipe de fato aconteceu, mas Silveira precisou sair antes por questões de saúde. Era hora de desacelerar e mudar de área.

Ao mesmo tempo em que não queria mais trabalhar daquela forma e lidar com todo o estresse, também não queria ficar desocupada. Ela entendia que sua experiência e bagagem profissional poderiam ser absorvidas pelo mercado de outra forma. “A palavra-chave para mim é troca de experiências: a junção da experiência da senioridade com a vontade do jovem de aprender e crescer.”

“Mas depois de tudo o que você passou, você ainda quer começar de novo?” Foi uma das frases que ouviu nesse percurso profissional – que coincidiu com um momento de luto em família, pandemia e problemas de saúde. Para ela, estar empregada ganhou um novo significado. “É um complemento, diferente do que eu entendia antes. Há cinco anos, se eu não estivesse trabalhando, eu simplesmente não existiria.”

Principal motivação não é dinheiro, é saúde mental

“Quantas vezes você já ouviu falar de alguém que parou de trabalhar e entrou em depressão?”, questiona Ramalho. Segundo a pesquisa Impactos do desemprego na saúde, emoções e relacionamentos, do SPC Brasil, após saírem de seus empregos 70% das pessoas relatam sentimentos de ansiedade e 60% consideram-se deprimidas.

Em janeiro de 2023, Silveira precisou fazer uma cirurgia por conta de problemas de saúde que enfrentou no passado. No entanto, após complicações, ficou impossibilitada de fazer uma série de atividades, inclusive voltar ao mercado de trabalho.

Ao longo de oito meses, ela sentiu sua saúde mental em declínio. “Eu fiquei bem mal, não conseguia fazer nada. Comecei a ficar triste, esquecer das coisas, achar que era improdutiva”, conta. Estava vivendo uma realidade com a qual não estava acostumada. “Isso te deixa em um vácuo, parece que está sobrando tempo na cabeça e você se vê sozinha.”

Pessoas como Silveira, que estiveram empregadas a vida toda e mantinham uma rotina agitada, sentem ainda mais os impactos da falta de ocupação para o corpo e a mente. “Se você não ajuda essa população em um prazo relativamente curto, isso se agrava. Primeiro vem a depressão, depois outras doenças”, explica a CEO.

De acordo com Ramalho, se sua mente está ativa, a tendência de se preocupar com outras enfermidades e a morte é bem menor. Ela ressalta que essa invisibilidade causada pelo desemprego e o etarismo determinam o grau de saúde do indivíduo.

“Já tive pessoas superqualificadas que chegaram a mim dizendo ‘eu só preciso sair de casa, me arranja qualquer coisa, eu trabalho de graça’. A maioria me fala que não é pelo dinheiro, é pela ocupação que o trabalho traz”, conta.

Ambas relatam que um jeito de se manter em movimento enquanto buscam uma nova colocação é fazendo cursos no seu ramo de atuação, participando de palestras, feiras e congressos, fazendo trabalhos voluntários e até mesmo atividades físicas. As alternativas podem auxiliar na saúde mental e física, além de serem formas de fazer networking e descobrir novas oportunidades e áreas.

O que define determinada idade como limite de atuação?

O debate sobre o que define ou não se a pessoa é capaz de realizar uma atividade baseado em sua idade tem aparecido em outros âmbitos. Um exemplo disso é a nova determinação da Globo, que pretende estabelecer idade máxima de 63 anos para seus funcionários continuarem em atuação.

A pauta também tem crescido nas eleições americanas, com a dúvida sobre a tentativa de reeleição por parte do presidente Joe Biden, atualmente com 81 anos. Sua idade avançada é motivo de questionamento, principalmente por seus opositores.

De acordo com Ramalho, existem diversas formas de trabalho que podem viabilizar a contratação da população 45+ e promover a inclusão no ambiente corporativo. Por meio do regime PJ, por exemplo, em funções consultivas, a pessoa pode trabalhar em mais de uma empresa, por um número reduzido de dias e horas, diferentemente do que acontece em um contrato CLT. É por isso que, em muitas empresas, a inclusão desse grupo social faz parte das políticas de Recursos Humanos voltada aos critérios ESG.

Seguindo a pirâmide etária brasileira, a CEO defende que é possível contratar pessoas até acima de 70 anos. Ela diz que as empresas têm uma ideia de que, com a idade, surgem algumas limitações que se refletem em lentidão e baixa produtividade e desempenho.

“Mas isso não se traduz em realidade. Isso, na verdade, está em qualquer um que não queira mais aprender, tenha preguiça de fazer algo novo e não tenha curiosidade”, comenta. O fenômeno do quiet quitting – tendência de optar por trabalhar apenas o necessário, sem interesses maiores pela função ou pelo crescimento profissional – mostra como até profissionais da geração Z (nascidos entre 1995 e 2010) podem passar por momentos de desinteresse e baixa produtividade.

Etarismo impõe barreiras e não promove diversidade

Segundo a profissional, algumas posturas comuns do RH diante da contratação de um indivíduo sênior é de que o currículo é muito bom, mas vai ficar pouco tempo na empresa; que é extremamente qualificado e, para o cargo que estão precisando, não vai querer ficar. Além disso, ela relata que alguns justificam o ambiente como sendo muito agitado, e que a pessoa não vai gostar ou se adaptar.

Um estudo da Ernst & Young em parceria com a Maturi mostrou que 78% das empresas entrevistadas se consideram etaristas e não possuem políticas de enfrentamento ao preconceito em seus processos seletivos.

“Falar que o sênior não tem lugar porque falta isso ou aquilo é etarismo, não tem outra palavra. É falta de convivência com essa população que tem muito a agregar”, enfatiza Ramalho.

Ela defende que esse tipo de contratação deve estar aberto nas empresas, a fim de gerar um ambiente inclusivo, que integre toda a pirâmide etária. “Não existe nada mais forte para combater o etarismo do que colocar uma pessoa sênior trabalhando ao lado da juventude e ela perceber o quanto esse tipo de profissional agrega.”

De acordo com a CEO, ao fazer isso, diminui o viés inconsciente de que um profissional mais velho não entrega resultados. “O bom mesmo é saber misturar essas faixas etárias. O sênior faz o jovem ampliar sua visão, e o jovem acolhe o sênior no que ele não souber”, complementa.

Silveira ressalta que, embora algumas empresas ainda não enxerguem e haja muita discriminação, é uma contribuição positiva para ambos os lados e traz produtividade para o trabalho.

Foto: Freepik
Etarismo impõe barreiras e não promove diversidade

 

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